Quando o Real Madrid deu início ao seu primeiro projeto galáctico, Florentino Pérez juntou Zidane, Ronaldo, Figo, Raúl, Beckham, Morientes e Roberto Carlos sob o comando de Carlos Queiroz. Quem?! Pois é... Se hoje ninguém se lembra de Carlos Queiroz, em 2003 o técnico português era ainda mais desconhecido. Seu grande trabalho até então? Auxiliar técnico de Alex Ferguson no Manchester United. Carlos Queiroz nunca havia sido o treinador principal de uma equipe grande – exceção feita ao Sporting em 1994/95, onde conquistou apenas a Taça de Portugal. O presidente do Real Madrid achou que, com o elenco que tinha, o time não precisava de direção. Ledo engano. Os Merengues passaram três anos seguidos sem conquistar nenhum título importante, em uma época em que o maior rival, Barcelona, nem tinha uma grande equipe. Carlos Queiroz foi sacado ao fim da temporada, voltou a ser auxiliar no United, teve uma passagem desastrosa pela seleção portuguesa e desde 2011 dirige a equipe nacional do Irã.
Sucederam Queiroz no Real Madrid José Antonio Camacho, Mariano García Remón, Vaderlei Luxemburgo e Juan Ramón López Caro até a chegada de Fabio Capello, com quem os Merengues voltaram a conquistar o Campeonato Espanhol.
Em seu segundo projeto galáctico, Florentino Pérez não repetiu os erros do passado. Quando da contratação de Cristiano Ronaldo, Kaká e Benzema, em 2009, também chegou ao Real Madrid o técnico chileno Manuel Pellegrini, que vinha de um excelente trabalho no Villarreal semifinalista da Champions. Com o Barcelona voando sob o comando de Pep Guardiola, Pellegrini não teve chance, e as apostas posteriores do presidente do Real Madrid foram mais altas: José Mourinho, Carlo Ancelotti e Rafa Benítez, todos treinadores consagrados, e mais recentemente Zidane, ídolo merengue e profundamente identificado com o clube.
Mais de dez anos depois, o Paris Saint-Germain vai, aos poucos, repetindo os erros daquele que foi o primeiro grande elenco midiático do futebol moderno. Desde que foi comprado pelo grupo de investimentos qatari, o clube francês contratou o consagrado Carlo Ancelotti e depois Laurent Blanc, que vinha da seleção francesa. Quando ficou claro que o trabalho de Blanc não renderia mais, ao invés de entrar na briga pelos grandes técnicos do mercado europeu, como faz com os jogadores, o PSG apostou em Unai Emery, treinador espanhol que ganhou a Liga Europa três vezes com o Sevilla, mas que está longe de estar entre os melhores do mundo – ou entre os melhores gestores de elenco do mundo. Após a vexatória eliminação da equipe parisiense da última Liga dos Campeões, com o 6 a 1 para o Barcelona no Camp Nou, e a perda do Campeonato Francês para o Monaco, terminando a temporada 2016/17 com apenas a Copa da França e a Copa da Liga Francesa, a passagem de Emery pelo PSG poderia ter sido encurtada, mas não foi isso que aconteceu. O Paris Saint-Germain enriqueceu ainda mais seu elenco, mas manteve o espanhol no comando do time.
Com 30 e 25 anos de idade, respectivamente, espera-se que Cavani e Neymar tenham maturidade suficiente para resolverem entre si, antes de entrar em campo, quem deve bater as faltas ou cobrar os pênaltis do PSG, de acordo com o aproveitamento, e não com o ego ou a disputa pela artilharia. Não é o caso. Desde a primeira partida dos dois juntos já houve discussão sobre quem cobraria a penalidade máxima. Caberia, então, ao gestor do elenco, Unai Emery, conversar com os craques em particular e estabelecer regras e limites bem claros. E tampouco foi isso que aconteceu. Após a quarta partida onde houve disputa entre ambos, desta vez escancarada, na frente da torcida e das câmeras de televisão, Emery finalmente se manifestou: “Acredito que os dois sejam capazes de chegar a um acordo, porque, se não se resolverem, quem vai decidir sou eu.”
Unai Emery já deveria ter resolvido essa questão antes de ela se tornar uma questão. Um elenco cheio de egos inflados muitas vezes precisa muito mais de um gestor de pessoas do que de um treinador revolucionário. É o técnico quem decide quem cobra as faltas, os pênaltis, os escanteios, quem fica na sobra, quem marca o primeiro ou o segundo poste. Decisões técnicas, que, num elenco superestelar, se tornam ainda decisões estratégicas. Na partida contra o Lyon, já diminuíram consideravelmente a troca de passes entre Neymar e Cavani, e o prejuízo é do Paris Saint-Germain. O futebol é, acima de tudo, um esporte coletivo.
O desentendimento no PSG – que ultrapassa o trio de ataque, já que Daniel Alves interveio e o time francês está recheado de brasileiros que também são companheiros de Neymar na Seleção e estão prontos para colocar-se ao lado do camisa 10 se necessário – escancara que a saída de Neymar do Barcelona foi mesmo para buscar seu protagonismo isolado. E se o jovem Mbappé ainda não tem cacife para liderar a equipe, Neymar não vai deixar que Cavani atrapalhe seus planos. MCN não será como MSN. Acabou a lua de mel em Paris.
Crédito: C.Gavelle/PSG